Publicado na revista Caros Amigos em agosto de 2008, com o título "Conservadorismo de esquerda degenera em autoritarismo". Acho uma leitura muito interessante para quem se considera um militante de esquerda.
Os grandes partidos socialistas não perderam a razão de ser, como querem seus adversários, mas precisam encontrar renovações programáticas e metodológicas que suplantem o perigo da obsolescência. A identidade progressista não pode resumir-se à defesa genérica do Estado, da igualdade social, do meio-ambiente e de grupos minoritários – plataformas insuficientes para as pretensões envolvidas e sujeitas à apropriação por qualquer projeto de poder.A adesão ao pragmatismo eleitoral, embora inevitável e talvez positiva em longo prazo, trouxe consigo o cinismo publicitário e as demandas de forças políticas obscuras. Para garantir votos e governabilidade, administrações formalmente renovadoras acatam excrescências ideológicas que prejudicam ou anulam os avanços conquistados. A convivência de opostos exige medidas conciliatórias que terminam gerando híbridos monstruosos. A predominância estatal e o discurso moralizador, quando impregnados pelo retrocesso, transformam-se em instrumentos para políticas repressivas, atrasadas e indignas da cartilha esquerdista.Muitas dessas metamorfoses nascem de distorções externas aplicadas a iniciativas originalmente razoáveis. Uma ação contra o banditismo tecnológico resulta em censura à internet. A lei que regulamenta a venda de bebidas alcoólicas nas rodovias vira uma forma inconstitucional e autoritária de achaque aos motoristas. A proteção à saúde dos não-fumantes degenera em criminalização do tabagismo.A base parlamentar frágil e a hostilidade generalizada dos meios de comunicação fazem o governo Lula particularmente vulnerável a tais contaminações. O fenômeno torna-se mais grave porque representa quase sempre um recuo no âmbito das liberdades individuais, que deveriam compor o cerne do ideário progressista moderno.
* Guilherme Scalzilli.
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